quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Trabalho e Trabalhismo

“Por intermédio do seu trabalho, o homem faz-se duplamente a si próprio, não só intelectualmente, na consciência, como na realidade, plasmando-se e ao mundo, de modo que chega a contemplar-se dentro de um mundo feito por ele.” (Hegel)
De acordo com a dinâmica das relações atuais, coloca-se a necessidade de compreender o trabalho como um mecanismo que torna o homem humano, satisfaz suas necessidades e é fonte de toda a riqueza, ou seja, “com seu trabalho o homem produz e é produto da sua obra” (Marx).
Na Grécia antiga, o trabalho era realizado com base na divisão dos homens em classes. Ao cidadão grego de maior estamento social estava vedado o trabalho braçal, pois ele deveria ter o tempo livre para se dedicar à reflexão, ao exercício da cidadania e à boa governança, enquanto que sobre os ombros dos indivíduos provenientes das camadas populares e sobre os escravos recaía a obrigação de garantir a produção dos bens indispensáveis à satisfação das necessidades de todos.
Durante a Idade Média, o conceito de trabalho não sofreu maiores modificações. Naquela época a economia era organizada para a subsistência e, por isso, a produção de bens para satisfação das necessidades de todos, inclusive dos senhores feudais e do clero, dependia do trabalho dos artesãos e dos servos da gleba presos à terra. Neste contexto, sob influência do cristianismo, verificava-se certo desapego às riquezas terrenas uma vez que as idéias de dominação vigentes condenavam o trabalho como forma de enriquecimento.
Com o advento do capitalismo, a coisa muda. Ganham força os que definem o trabalho como o grande fator de enriquecimento pessoal. É verdade que, a partir daí, expande-se a produção e refinam-se os mecanismos de exploração dos trabalhadores: já não eram escravos, nem servos, mas homens livres sobre os quais recaía, e ainda recai, a função de gerar riquezas, acumuladas pelos proprietários dos meios de produção.
Enquanto Hesíodo, filósofo grego da antiguidade, tinha uma visão ética e idealizada do trabalho, pois acreditava que o ócio e a inércia encontravam-se estritamente vinculados à injustiça, à desonra e ao pecado, Rousseau, francês da época da consolidação do capitalismo, tinha uma visão distinta. Esse pensador iluminista considerava o trabalho a principal causa da desigualdade entre os homens na medida em que o conhecimento e os frutos da tecnologia gerados por esse mesmo trabalho eram distribuídos de forma desigual.
Adam Smith talvez tenha sido o maior dentre os teóricos do capitalismo industrial. Em 1776, ao escrever sobre esse modo de produção ele próprio reconheceu que a riqueza de uma nação depende essencialmente da produtividade do trabalho. Ele só não disse que a força de trabalho, responsável por tal produção, pouco ou nada usufrui da riqueza gerada por ela. Não é novidade para ninguém que as principais idéias desse economista inglês, até hoje, são empregadas nas economias que seguem esse modelo: livre iniciativa, livre mercado, propriedade privada dos meios de produção, apropriação privada dos lucros, etc..
Se levarmos em conta o valor do trabalho para história do homem, provavelmente, os estudos feitos por dois pensadores contemporâneos - Friedrich Engels e Karl Marx - tenham aportado a melhor contribuição. Segundo eles, o trabalho é a condição básica e fundamental de toda a vida humana, ou seja, é em tal grau importante que chegam a firmar que ele “criou” e “moldou” o próprio homem ao longo do seu processo evolutivo. E mais, conseguiram provar, cientificamente, que do trabalho deriva a produção de toda a riqueza, mas que nas sociedades capitalistas, como a brasileira, a acumulação da riqueza produzida pelo trabalho se dá pela mão de quem menos trabalha, isto é, pela classe social detentora da propriedade dos meios de produção. Marx e Engels demonstraram, de forma insofismável, que a sociedade capitalista se divide, basicamente, em duas classes com interesses antagônicos: os donos do capital que promovem a apropriação privada das riquezas produzidas pelos trabalhadores e estes, que geram a riqueza, mas que não usufruem dela porque a outra classe, dos proprietários, toma para si parte considerável da riqueza produzida pela força de trabalho.
Num mundo com as contradições apontadas por Engels e Marx, cujas idéias acabaram reforçadas por outros socialistas do nosso tempo, nasce o Trabalhismo como movimento político que prega o primado do trabalho sobre o capital por saber que ele é a expressão real do valor da força do homem, da sua capacidade física e intelectual. Em síntese, “trabalhismo” passou a ser sinônimo de luta do operariado organizado em defesa dos seus interesses políticos e econômicos.
Embora originário da Inglaterra do século XIX, no Brasil, o trabalhismo começa a mostrar força na primeira metade da década de 1930 quando institui-se o salário mínimo, limita-se a jornada de trabalho a oito horas, cria-se o voto secreto e estende-se esse direito às mulheres, reconhece-se os sindicatos e há rupturas com o colonialismo, etc. No início da década de 1940, o trabalhismo é responsável pela criação da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho – que, ante da voracidade crescente do capital, torna-se o grande instrumento de salvaguarda dos direitos e de proteção dos trabalhadores. Nestes anos, o presidente Getúlio Vargas dá ênfase à instalação das indústrias de base (bens de produção), criando as grandes empresas estatais de energia e de metalurgia, a fim de aprofundar o projeto de desenvolvimento nacional independente.
Inspirados nesses avanços, em 1945, nasce o Partido Trabalhista Brasileiro. Em 1950, Vargas e os trabalhistas voltam ao poder pela força do voto. O presidente Vargas faz de seu novo governo uma oportunidade para retomar a luta pela soberania nacional e para aprofundar as transformações sociais destinadas a melhorar a vida dos trabalhadores. Em 1961, com o trabalhista João Goulart na Presidência da República, o PTB passa a defender as Reformas de Base (agrária, universitária, bancária, urbana, tributária, política, etc) com o propósito de construir uma nova ordem social e econômica no Brasil. Tendo em vista que estas reformas contrariavam os interesses do grande capital nacional e estrangeiro, em março de 1964, um golpe cívico-militar depõe Jango e o PTB, fechando um ciclo onde o trabalhismo foi a principal manifestação ideológica de esquerda brasileira.
Hoje, impõe-se a necessidade de construir os espaços e conformar as ferramentas necessárias para afirmar um trabalhismo renovado para a luta institucional. Em parceria com os movimentos sociais, com as entidades de trabalhadores, com as universidades autônomas, com as organizações da sociedade e, fundamentalmente, com os brasileiros abertos a discutir as diferentes formas de propriedade, é hora do PDT romper paradigmas e fazer algo capaz de recuperar, no imaginário popular, a confiança na democracia como forma de processar as decisões políticas e a crença no socialismo como modo de produzir e distribuir os bens indispensáveis à satisfação das necessidades do povo brasileiro.
Desde o Golpe de 1964, o aprofundamento das desigualdades sociais e a dependência externa têm colocado em risco a existência do Brasil como sociedade organizada e nação soberana. De lá para cá, tal como diria Darcy Ribeiro, numa perspectiva histórica, a revolução brasileira acumulou forças, o que falta é criar as condições políticas para que ela aconteça. O trabalhismo de esquerda de que o Brasil precisa não necessita reinventar a política. Contudo, precisa ter um projeto claro e saber disputá-lo na sociedade, bem como precisa criar as condições para que o povo seja protagonista e reivindique para si a tarefa de construir o Brasil que o trabalhismo sempre quis.
Ninguém melhor do que Leonel Brizola sabia que o trabalhismo é o caminho brasileiro para o socialismo. Sempre que citava um afirmava o outro. O novo trabalhismo brasileiro não pode dissimular suas perspectivas e propósitos, em especial o fato de que deseja retomar o sentido das Reformas de Base tendo em vista que elas são atualíssimas. Se tiver êxito nessa iniciativa, o PDT de hoje, herdeiro do trabalhismo de ontem, estará pronto para ser um instrumento útil na luta do povo por uma sociedade livre, fraterna e igualitária.

Fonte:
http://www.google.com.br/search?hl=pt-BR&q=Trabalhismo+&btnG=Pesquisar&meta=

Nenhum comentário: